Núcleo de temática cristológica – Iconografia da Paixão
“Ecce Homo” / “Senhor da Cana verde” (Cristo sentado, com manto vermelho e coroa de espinhos – estropiada em parte - aguardando a condenação no “Gábata”, após exibição pública por parte de Pilatos) ou Imagem cristológica extraída de conjunto expressivo da “Cena de Opróbrios” (que não terá chegado na sua totalidade ao Museu de Lamas) – Escultura de vulto concebida em madeira policromada, estofada e carnada, de produção correspondente a um núcleo / oficina portuguesa de cariz erudito. Enquadrável nas diretrizes próprias da imaginária religiosa da segunda metade do século XVII, regrada pela Contrarreforma. N.º de Inventário: 1957. 1175.
Obra escultórica de cariz erudito, dada a pormenorização da sua anatomia (sobretudo no trato do seu costado e dramatismo da mímica facial de Jesus e respetivos pormenores capilares ondulados, com barba bífida e cabelo longo), e da dinâmica do panejamento associado (um manto vermelho de pregueados bastante profusos). Esta escultura de vulto, em madeira policromada, estofada e carnada, veicula, mediante trabalho especializado remontante à segunda metade do século XVII, a iconografia de uma das variantes do episódio provindo do “Novo Testamento" que se intitula “Ecce Homo”. Por vezes denominado na Arte sacra portuguesa pela nomenclatura paralela de “Senhor da Cana Verde”. Ou seja, o momento no qual Pilatos, a par de Barrabás (um criminoso de amplo cadastro), exibe a figura escarnecida de Jesus - coroado de espinhos, com manto e cana verde (coroa e cana estropiadas neste exemplar) – e pronuncia o termo “Ecce Homo” (em português, “Eis o Homem”). Interpelando a plateia que, imbuída pela influência dos sumo-sacerdotes, não demonstra anuência pela libertação cristológica. Pelo contrário, vocifera pelo indulto a Barrabás e sequente Crucificação de Jesus.
Pelo posicionamento figurado, com Cristo sentado, para além da possibilidade de associarmos esta Imagem à temática descrita, a sua existência poderia advir de um conjunto escultórico, do qual foi retirado e individualizado no quadro do Museu de Lamas - e que a carência de documentação nos limita na pretensa aferição - sintomático de uma ocorrência precedente no quadro das fontes escritas da “Paixão de Cristo”. À “Cena de Opróbrios”, na qual Jesus sentado, de expressão dramática, flagelado (como indicia a sua carnação) e aprisionado por cordas nas suas mãos, recebe insultos por parte dos Soldados Romanos. Que, por fim, apelidando-o de “Rei dos Judeus”, lhe aplicam o “ceptro” (a “Cana Verde” que esta escultura perdeu), o “manto real” (interpretado pelo manto vermelho sobre os ombros, caído pelo peito e costas), e a “coroa” (de espinhos, parcialmente fragmentada neste caso).
“Crucificação simbólica” / “Drama do Calvário” (Jesus morto de três cravos, Maria e São João Evangelista) – Esculturas de vulto concebidas em madeira policromada, estofada, dourada e carnada, de produção correspondente a oficinas portuguesas de cariz erudito. Enquadráveis nas diretrizes próprias da imaginária religiosa situada entre o término do século XVII e o desdobramento da centúria de XVIII, regrada pela Contrarreforma. N.º de Inventário: 1957. 1164 a, b e c.
Conjugadas no intuito de figurar uma cenografia iconográfica difusora da especificidade da “Crucificação simbólica” / “Drama do Calvário”, com Cristo ao centro ladeado por Maria e São João Evangelista, estas obras de vulto inteiro, procedem de contextos produtivos / oficinas de imaginária desiguais entre si. Especificamente, Jesus morto corresponderá a uma autoria e, pelas características da abordagem aos drapeados ou esgrafitado dos panejamentos e da própria anatomia (no tipo de mãos, registo capilar, volume e mímica de rosto), Maria e São João advêm, porventura, do mesmo eixo de execução. Sendo a congregação atual, visível na “Sala da Capela de Delães”, resultante, em exclusivo, da agregação destas obras ao espólio de Henrique Amorim e ao espaço expositivo do Museu de Lamas.
De matriz realista, tanto na definição corpórea como nas vestes, estas Imagens sublinham a dureza física, mas principalmente emocional da morte de Jesus Crucificado. Com o corpo flagelado nalguns segmentos, perizonium como panejamento único, rosto voltado para a região do seu ombro direito e três cravos (dois deles trespassam as suas mãos e o último atravessa, simultaneamente, os dois pés sobrepostos), acompanhado pela lamúria e dramatismo da pose das duas obras que o enquadram. Maria, sua mãe (de manto e véu azul com faixa de douramento e túnica rosada / acastanhada marcada por parcos pormenores de esgrafitado), sofredora, como denota o semblante facial e a colocação das mãos sobre o corpo. Lamento que se repete na mímica e gestualidade de São João, adornado pelo seu manto vermelho e alva esverdeada. Que, inusitadamente, acolhe o mesmo tipo de esgrafitado descortinável na figura mariana.
“Crucificação simbólica” / “Drama do Calvário” (Jesus morto de três cravos, Maria e São João Evangelista) – Esculturas de vulto concebidas em madeira policromada, estofada, dourada e carnada, de produção correspondente a oficinas portuguesas de cariz erudito. Enquadráveis nas diretrizes próprias da imaginária religiosa situada entre o término do século XVII e o decurso da centúria de XVIII, regrada pela Contrarreforma. N.º de Inventário: 1957.1165 a, b e c.
Embora associadas no propósito de figurar um conjunto iconográfico veiculativo da “Crucificação simbólica” / “Drama do Calvário”, com Cristo ao centro ladeado por Maria e São João Evangelista, estas esculturas provêm de contextos produtivos / oficinas de imaginária distintas entre si. Nomeadamente, Jesus morto corresponderá a uma autoria e, pelos pormenores característicos do trato anatómico (especificamente do volume das mãos, modelo capilar e tipologia de rosto), Maria e São João advêm, porventura, do mesmo quadro de execução. Sendo a tríplice criada remanescente, em exclusivo, à incorporação destas obras no espólio e espaço expositivo do Museu de Lamas.
De configuração realista, tanto na anatomia como na indumentária, estas obras sublinham a dureza física e emocional da morte de Jesus Crucificado. Com o corpo flagelado, perizonium como panejamento singular, rosto prostrado sobre o ombro direito e três cravos (dois deles atravessam as suas mãos e o último transpõe, concomitantemente, os dois pés sobrepostos), acompanhado pelo preito e dramatismo da pose das duas imagens que o enquadram. Maria, sua mãe, de vestes azuis, mímica sofredora e mãos unidas numa atitude orante. A mesma que São João, de túnica esverdeada e manto vermelho, assume.
“Crucificação simbólica”, com Cristo morto de três cravos – Escultura de vulto, concebida em madeira policromada e carnada, de produção espontânea, desprovida, de certo modo, de realismo exacerbado ou proporção. Correspondente, na sua autoria, a um núcleo regional (extensível à diáspora lusíada) / santeiro de cariz popular. Enquadrável nas diretrizes próprias da imaginária religiosa portuguesa do século XVII. N.º de Inventário: 1957.1161
Com sobeja desproporcionalidade anatómica e carência de realismo, esta obra de imaginária, concebida em madeira policromada, carnada e de cariz popular, difunde a iconografia da “Crucificação simbólica”. Ou seja, privilegia o vulto isolado de Cristo morto, com o rosto subtilmente voltado para o ombro direito, agregado ao madeiro da Cruz latina por três cravos (dois deles perpassam as suas mãos e o último perfura, conjuntamente, os dois pés sobrepostos).
Em termos pictóricos, as maiores evidências desta Imagem residem no trato dos joelhos flagelados, no posicionamento e sugestão de pregueados do perizonium modelado a partir dos quadris. E, por fim, no tipo de barba bífida e cabelo liso definido (contrastante com a ondulação habitual que pauta o registo capilar de Jesus). Sintomático, porventura, da espontaneidade e falta de domínio escultórico do seu contexto autoral. Ou, quiçá, de alguns modelos cristológicos típicos da diáspora portuguesa.
“Lamentação sobre Cristo morto” (excerto escultórico, por certo incompleto, figurativo de Maria, São João Evangelista e Maria Madalena) – Volume escultórico concebido em madeira policromada, estofada, dourada, esgrafitada e carnada, de produção correspondente a núcleos / oficinas portuguesas de cariz erudito. Enquadrável nas diretrizes próprias da imaginária religiosa situada entre o término do século XVII e o desenrolar da centúria de XVIII, regrada pela Contrarreforma. N.º de Inventário: 1957.1137
Desprovido do féretro de Cristo morto, o que indicia um certo estropiamento desta obra, o volume escultórico em causa, aplicado sobre uma base de motivos vegetalistas e florais, abrange as figuras Maria ao centro, amparada na sua dor por São João Evangelista à sua direita e Maria Madalena à sua esquerda. Interpretando a narrativa da “Lamentação sobre Cristo morto”, antecessora do sepultamento e ressurreição subsequente.
Do ponto de vista plástico este registo beneficia de tratamento realista tanto na fisionomia, como na expressividade fácil, elementos capilares e drapeados das vestes de cada uma das personagens preconizadas. Salientando-se, na sua paleta cromática, a mancha azul da indumentária mariana, o contraste de vermelho e verde de São João e a dicotomia de castanho e vermelho visível na roupa de Maria Madalena. Apontamentos aos quais acrescem faixas e pormenores de douramento.